«Tenho mais condições, para tentar impedir que alguém seja eleito do que ser eleito»
«Os mandatos que correspondem aos últimos mandatos de um presidente de câmara, são sempre mandatos desafiantes e interessantes. São mandatos de “fim de ciclo” e de preparação do “próximo ciclo”. Neste contexto, são colocados desafios à autoridade de quem ainda está, inteligência e probidade a quem se sente em condições e com vontade de querer “vir a estar”».
Mário Neves, vereador eleito como independente pela Coligação Maia em Primeiro, é caso raríssimo de longevidade em funções autárquicas. Eleito pela primeira vez em 1997, entrou agora no seu oitavo mandato. O Maia Hoje quis tentar perceber o “segredo” dessa constância.
Maia Hoje – Eleito vereador da Câmara Municipal da Maia em 1997 e sucessivamente reeleito, entrado agora no seu oitavo mandato nessa função, é evidentemente um caso de raríssima longevidade política, sobretudo tendo em conta que é independente. Como explica esse facto?
Mário Nuno Neves – De uma forma muito simples. Isso acontece por uma razão tríplice: a primeira, por causa da vontade do povo maiato; a segunda por causa da minha vontade; a terceira, por causa da vontade dos três presidentes que me escolheram, a saber, Vieira de Carvalho, Bragança Fernandes e Domingos Tiago.
MH – Neste seu longo percurso já foi e é responsável por vários pelouros, o que lhe proporcionou uma visão integral da instituição e do próprio governo local. Consegue lembrar-se de todos?
MNN – Penso que sim. Ao longo estes anos fui tendo responsabilidades em várias áreas. Cultura, Reforma Administrativa, Qualidade, Sistemas de Informação, Ordenamento Territorial, Proteção Civil, Segurança, Polícia Municipal, Turismo, Atividades Económicas, Recursos Humanos, Mobilidade e Transportes, Relações Internacionais, a que se juntam responsabilidades na Academia das Artes, EM, na Fundação do Conservatório de Música da Maia, na Empresa Metropolitana de Estacionamento da Maia, EM.
MH – E este será o seu último mandato?
MNN – A não ser que circunstâncias políticas muito fortes, obriguem a um cenário diferente, estou convencido disso. Eu, conjuntamente com o Eng. Bragança Fernandes e com o Eng. Silva Tiago, faço parte do último lote “Vieira de Carvalho”, muito marcados por ele e responsáveis pela manutenção e acrescento do seu legado, que foi transformar o Concelho da Maia num dos mais desenvolvidos, vanguardistas e prósperos do País e mantê-lo assim, num contexto de muitas dificuldades políticas, sociais e económicas. Com ele e a partir dele, criamos condições para que o futuro da Maia seja radioso, desde que haja estabilidade política e consistência no pensar e no agir.
MH – Qual foi o momento mais difícil que viveu na Autarquia?
MNN – Foi, sem qualquer dúvida, a morte precoce do Doutor Vieira de Carvalho, que exigiu, muito especialmente do Eng. Bragança Fernandes, do Eng. Silva Tiago e de mim próprio, um esforço muito grande para que essa enorme perda para a instituição e para o Município fosse minorada o mais possível. Acho que fomos protagonistas de uma transição exemplar, única a nível nacional e que também explica muito da consolidação desta maioria no pós-Vieira de Carvalho.
MH – Que antevisão faz deste próximo mandato?
MNN – Os mandatos que correspondem aos últimos mandatos de um presidente de câmara, são sempre mandatos desafiantes e interessantes. São mandatos de “fim de ciclo” e de preparação do “próximo ciclo”. Neste contexto, são colocados desafios à autoridade de quem ainda está, inteligência e probidade a quem se sente em condições e com vontade de querer “vir a estar”. São mandatos em que se procura concretizar projetos e dar início a outros que possam assegurar uma garantia possível a um continuar da senda de prosperidade assente no bom governo. São mandatos de grandes movimentações políticas, quer por parte das maiorias, quer por parte das oposições, sendo sempre potencialmente mais perigosas aquelas que acontecem dentro das maiorias. Raramente as Câmaras se perdem por causa da ação das oposições, mas sim por erros cometidos pelas “situações”. Eu, entendo que a Maia só terá a ganhar se o próximo ciclo seja protagonizado pela atual maioria política, pois a continuidade e a estabilidade essencial ao bom governo estariam muito mais asseguradas, e na parte que me toca, tudo farei para que isso aconteça, o que me obriga a estar muito atento, não só ao exercício das várias responsabilidades que me cabem no contexto do atual Executivo, mas também ao contexto político mais geral, em que ponderarei muito seriamente o tempo, o modo e as circunstâncias em que eventualmente terei que falar e agir.
MH – Nunca teve a ambição de ser Presidente da Câmara?
MNN – Sinceramente…não. E por várias razões. A primeira delas é que tenho a convicção que até poderia ser um bom presidente, mas seria certamente um péssimo candidato, sou muito mais de um trabalho recatado de que de uma exposição permanente; a segunda é porque sendo independente e financeiramente muito remediado, sem qualquer partido a suportar tal candidatura, jamais conseguiria reunir os meios necessários a uma campanha; a terceira é porque sempre reconheci aos três presidentes que servi e sirvo qualidades mais do que suficientes para o exercício das referidas funções. Hoje em dia, tenho muitas mais condições, se necessário, para tentar impedir que alguém a quem eu não reconheça qualidades e competências “for the job” seja eleito do que eu próprio ser eleito, o que já não é mau. Eu não me esqueço nunca que antes de ser autarca, sou munícipe, e enquanto munícipe não quero incompetentes e fala-baratos a governar a minha terra.
MH – E teme que isso possa acontecer?
MNN – O quê? Que surjam candidatos a quem não reconheça essas qualidades e competências? Temer não temo, mas há sempre essa possibilidade. Para mim, a sucessão do Eng. Silva Tiago, tem que ser assegurada por quem já tenha provas dadas de competência política, um conhecimento profundo do Concelho e da instituição Câmara Municipal da Maia, obra palpável já executada e natural da Maia. Se não reunir essas condições, de preferência cumulativamente, não poderá contar com o meu apoio, isso é certo.
MH – E como pensa exercer o seu próximo mandato?
MNN – Sem qualquer novidade, pensando e executando o mais possível e o melhor que souber. Na verdade, o propalado segredo da minha longevidade assenta só nisso. E talvez noutra coisa. Talvez assente, também, no facto de eu nunca ter usado as minhas funções para a promoção da minha notoriedade pessoal, mas sim da instituição e do povo que jurei servir em todas as tomadas de posse.
MH – Se ele lhe perguntasse, o que recomendaria ao atual Presidente da Câmara, para que otimizasse este seu último mandato?
MNN – O Eng. Silva Tiago não precisa que lhe façam recomendações, mas se isso acontecesse diria que continuasse a ser como é: visionário, trabalhador e concretizador, que robustecesse o seu Gabinete de forma a fazê-lo funcionar como um verdadeiro órgão de auxílio que o liberte de muitas tarefas que o desgastam desnecessariamente, que reformasse profundamente o seu gabinete de comunicação, para o tornar capaz de uma comunicação muito mais profissional e adequada à contemporaneidade e ao estatuto de predominância que a Maia já alcançou, enfim alguns pequenos ajustes potenciadores da projeção do seu próprio legado, que quanto mais e melhor será preservado quanto mais ele se empenhar numa transição pacífica e natural da presidência da Câmara quando tal acontecer, sem condicionar, mas orientando, de forma clara.
MH – E você, quando um dia sair, o que fará?
MNN – Olhe, as minhas memórias políticas, seguramente, não as escreverei, para desgosto de alguns e alívio de muitos mais, embora tenha a firme convicção que seria um “bestseller”, pelo menos a nível local. Ao longo destes anos testemunhei, participei e percebi coisas muito interessantes. Algumas hilariantes, outras dramáticas, mas todas com impacto na vida política concelhia. Agora, respondendo a sério à sua pergunta, digo-lhe que não sei, nem me preocupo muito com isso. Eu sou quadro de uma das maiores instituições financeiras do País, sou professor universitário, tenho uma vasta experiência acumulada que pode ser útil a muitas instituições, tenho ainda uma cabeça a funcionar e duas mãos aptas a trabalhar. Olhe pode ser que decida ir “ganhar dinheiro de jeito”, que foi coisa que nunca fiz, não por não ter engenho e arte para tal, mas por uma questão de berço e feitio. Será uma nova experiência, quem sabe. Sempre achei que fazer planos a um prazo superior a seis meses é um exercício inútil, o que será, será, haja saúde.
MH – Gosta de dar aulas porquê?
MNN – Porque considero ser uma espécie de obrigação. Eu dou aulas completamente “pro bono”, não recebo um cêntimo por isso, mas faço-o com um enorme prazer, porque me permite conviver com as novas gerações, aprender com elas e ensinar-lhes alguma coisa. Quem exerce cargos políticos tem que perceber com muita clareza o seu próprio tempo, e quem melhor que os jovens para me facultar essa aprendizagem? Com os da minha geração, já não aprendo nada, e os da anterior já cá não estão.
MH – Já consegue avaliar a atual oposição no contexto do Executivo Municipal?
MNN – Fazer oposição a uma maioria sucessivamente sufragada pelos eleitores é muito difícil, mas a impressão que tenho é que tentam fazer o seu papel o melhor possível, criticando de forma construtiva e razoável, fazendo o que as oposições democráticas têm que fazer, evitando a cumplicidade, sem serem destrutivas.
MH – É a favor dos executivos monocolores?
MNN – Não. Acho que as oposições fazem sempre falta em todos os órgãos, quer de carácter executivo, quer de carácter fiscalizador.
MH – Não, então, favorável, às alterações que se equacionam em termos de Poder Local?
MNN – Não vejo nenhuma necessidade. O atual modelo funciona perfeitamente. Para quê mudar? Experimentar? É o modelo vigente que transformou o Poder Local no poder mais confiável do País. Foi este, não foi outro qualquer. Aliás, sobre esta matéria, os senhores presidentes de câmara, devem estar muito atentos, já que há alterações que aparentemente podem representar reforço de poder, mas que, na prática, são autênticas armadilhas.
MH – Que votos formula para o ano de 2026?
MNN – Que seja para todos nós, nacionais residentes ou emigrados, imigrantes e refugiados, um ano de paz, de redução das desigualdades, de inclusão, que seja um ano sem demagogias, xenofobias e mentiras.



