Faz o que eu digo, não faças o que eu faço
Corria o ano de dois mil e quinze e, após a vitória eleitoral da coligação “Portugal à Frente”, liderada por Pedro Passos Coelho, nascia a “Geringonça”.
Com António Costa ao leme, fielmente auxiliado pelo seu adjunto de comando socialista, Pedro Nuno Santos, juntavam-se à tripulação Catarina Martins e a sua equipa do Bloco de Esquerda (que assim ia ganhando experiência para futuros passeios de flotilha) e Jerónimo de Sousa e o seu Partido Comunista que, aos dias de hoje, vê a sua tripulação parlamentar reduzida a um kayak de passeio.
António Costa e o Partido Socialista faziam com que o costume não virasse regra e normalizavam o facto de quem não vence eleições poder governar, com a total cobertura da Constituição da República Portuguesa.
Era assim, naquele outono de 2015.
Nas autarquias locais, nomeadamente nas câmaras municipais, em conformidade com a lei, os executivos são compostos com base no método de representação proporcional (batizado com o nome do seu criador, Hondt), que traduz em mandatos o número de votos efetivos em cada lista partidária.
Assim é também nas assembleias municipais e assembleias de freguesia.
Este método de eleição é aceite por todos.
No que aos executivos de freguesia diz respeito, diz a lei que o presidente da junta de freguesia é o cidadão que encabeça a lista mais votada à assembleia de freguesia, cabendo-lhe exclusivamente a si apresentar à assembleia os nomes que irão compor o seu executivo.
Pode aquele que assume a presidência da junta apresentar os nomes que entender, de entre os eleitos, sendo ou não da sua força política.
Cabe, após essa apresentação, à assembleia de freguesia, legitimamente eleita e composta tendo em conta a representatividade anteriormente referida, votar a proposta apresentada pelo presidente da junta.
Tendo em conta o passado histórico, e achando eu que todos os partidos, nomeadamente o Partido Socialista, veem com bons olhos a inclusão de vereadores eleitos por listas que não a vencedora no executivo municipal, ao verem as suas maiorias serem relativas, esperaria que respeitassem a vontade dos eleitores e não estranhassem a possibilidade de convidar para os seus executivos elementos de outras forças partidárias.
Há hoje quem diga que incluir outras forças políticas num executivo de junta de freguesia não é mais do que esvaziar a assembleia do seu papel fiscalizador.
Interpretando extensivamente, se uma assembleia que suporta um executivo que inclua várias forças políticas — traduzindo a vontade clara dos eleitores, cujo peso será o mesmo da própria assembleia — de nada serve e vê o seu papel esvaziado quando há maioria absoluta, assim o será também.
Enquanto autarca, entristece-me ver menorizado o papel dos membros da assembleia de freguesia, principalmente quando isso é feito por aqueles que a ela já presidiram.
Há também quem, em meros atos de chantagem política, ache normal, em atos públicos, dizer que quem não aprova executivos de quem teve vitórias sem maioria bloqueia a atuação de uma junta de freguesia que se vê privada de apoiar socialmente quem mais precisa, fazendo da urgência e da necessidade armas de arremesso político.
Claramente, há dois pesos e duas medidas.
À medida que a política se aproxima mais da realidade de cada um, é aguçada também a necessidade de garantir as amarras ao lugar e esquecer a voz dos eleitores.
Quando convém, a inclusão é virtude, quando não convém, é obstáculo. Quando o poder está na mão de uns, tudo se justifica, mas quando passa para outros, tudo se critica.
Mas a democracia não é propriedade de nenhum partido. É um contrato entre eleitores e eleitos, contrato esse que deve ser honrado, mesmo quando o resultado não agrada a alguns.
A política de freguesia, mais próxima das pessoas, devia ser exemplo de respeito, equilíbrio e serviço.
E é por isso que importa dizer, com toda a clareza que a vontade dos eleitores não se negocia. Respeita-se. Sempre.
Pedro Miguel Carvalho
Empresário, júri, blogger e podcaster no sector vinicola.
Foi vice-presidente da JSD da Maia e conselheiro distrital da JSD e do PSD.
Deputado na AM Maia pelo PSD/CDS.
Membro do “Milheirós Fest” e de coletividades maiatas.


