Nelson Ferraz escreve carta aberta ao Bispo do Porto

Nelson Ferraz escreve carta aberta ao Bispo do Porto

Nascido em 1952, Nelson Ferraz reside atualmente na Maia. O escritor foi cronista no jornal Maia Hoje e começou a publicar poesia ainda durante os anos 70.
O autor enviou para o nosso jornal uma carta direcionada ao Bispo do Porto, D. Manuel Linda.

CARTA ABERTA AO BISPO DO PORTO

Assunto: SABIA QUE FECHARAM A CAPELA DO MONTE PEDRAL?

Vossa Excelência Reverendíssima,

D. Manuel da Silva Rodrigues Linda, Bispo do Porto,

Principiando por apresentar-lhe os meus mais respeitosos cumprimentos, venho, por este meio, junto de Vossa Excelência Reverendíssima, dar-lhe nota de um caso, que tem tanto de estranho como de incompreensível, relacionado com o encerramento (há já algum, muito tempo) da capela do Monte Pedral, situada na Rua Padre José Pacheco do Monte, no Porto.

Devo dizer que fui aluno, nos anos cinquenta/sessenta, das Escolas de Jesus, Maria e José, que, nessa altura, era uma escola em funcionamento ao lado da referida capela, nas mesmas instalações onde, hoje, está sediada a Associação do Monte Pedral.

Nesses, já longínquos, tempos, a capela do Monte Pedral tinha uma função catalisadora de várias “actividades” essenciais, tais como: o funcionamento das catequeses, a realização de missas, comunhões e outras cerimónias religiosas, e as concorridas e nostálgicas novenas de Maio, onde eu costumava ir com a minha avó.

A utilidade da capela reporta a tempos anteriores à minha infância, mas, pelo menos, desde a década de cinquenta, e por longos anos depois, que sou testemunha dessa mesma utilidade omnipresente, imprescindível no quotidiano das gentes e comunidade circundante.

Nasci em 1952 e vivi, até aos anos setenta, na Rua da Aliança, que é uma rua muito próxima desse local.

Para a minha família (recordo) ir à missa, era ir à missa daquela capela porque, naquele tempo, as opções do Marquês, da Lapa e do Carvalhido eram escolhas secundárias, para lá das fronteiras, quase familiares, da zona do Monte Pedral.

Ir à capela (ou à Igreja, como costumava dizer-se) era ir àquele “sítio” mítico que assumiu, durante várias gerações, uma importância fulcral nos hábitos sociais e religiosos dos cidadãos.

Era local de culto, de reunião, de convívio e de partilha entre gentes que viviam por ali, vizinhos da Casa de Jesus, de Maria e de José. Famílias.

Comprovo, por isso, a importância da capela, desta capela do Monte Pedral, como centro aglutinador das gentes que a frequentaram e que eram pessoas habituadas a viver junto do seu, muito seu, particular local de oração.

Por certo, haverá uma razão qualquer para que a capela continue, inexplicavelmente, encerrada ou, se calhar, não há razão nenhuma. Capricho?

É isso que é preciso saber-se. É isso que se exige a pessoas de bem.

Não é tolerável que uma capela destas seja fechada por qualquer motivo que, certamente, não está de acordo com aquilo que se pretende e se exige da Igreja e dos seus homens que a representam, devendo, eles próprios serem exemplo de paz, compreensão e despojamento.

Não caberá a um padre, a um Bispo ou a outro membro do clero, munir-se de um espírito, completamente, alheio ao superior interesse do povo, para se achar no direito, ou com o poder, de decidir privar as pessoas de utilizar o SEU lugar de oração, a SUA capela, em nome de uma qualquer afirmação de poder, baseada em qualquer estupidez económica, patrimonial ou simples birra eclesiástica.

Nos dias de hoje, há que ir ao fundo das questões. É isso que se pretende, neste caso.

Enquanto isso, a capela está fechada, a deteriorar-se por fora e por dentro a cada dia que passa, e os utentes da Associação do Monte Pedral rezam ao lado dela, impedidos de o fazer naquele que seria o sítio certo para o fazerem, no acolhimento e aconchego do seu interior.

Afinal de contas, a capela, ainda, é uma Casa de um Deus perene e não a propriedade de um qualquer caduco membro do clero.

Quando, há dias, na qualidade de poeta/escritor, e a convite da Direcção da Associação do Monte Pedral, estive em amena tertúlia com os Utentes da Associação, senti-me na obrigação de escrever a Vossa Excelência Reverendíssima para dar-lhe conta desta situação que não tem nada de Humana, mas, pelo contrário, enferma de lógica e coerência.

Mais do que a reposição da normalidade, pede-se que haja explicações para o que foi e está a ser feito para que este “roubo” seja punido e/ou que a capela seja, rapidamente, devolvida a quem pertence, para que não seja preciso rezar na rua ou junto às suas portas fechadas, como, às vezes, acontece.

Agradeço, desde já, a Vossa Excelência Reverendíssima, que proceda em conformidade, para que esta situação seja resolvida. Presumo, eu, que terá motivos e autoridade para o fazer.

O meu sincero obrigado.

A expectativa de que a normalidade seja, efectivamente, reposta, vale o esforço de todos.

Os meus mais respeitosos cumprimentos,

Nelson Ferraz

18 de Agosto de 2022

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