A água e a origem do mundo. A Água fonte de vida.

A água e a origem do mundo. A Água fonte de vida.

A ONU (Organização Das Nações Unidas) declarou em 1992 o dia 22 de março como o Dia Mundial da Água. Divulgou também num importante documento a “Declaração Universal dos Direitos da Água”.

Tais atos revelam preocupação com a Água. Com efeito, dois terços do planeta Terra são formados por este precioso líquido e a pouca quantidade de Água potável, cerca de 0,008 %, do nosso planeta está sendo contaminada, poluída e degradada pela ação do homem.

O Clube Unesco da Maia não podia passar em claro a vital importância da Água. Temos presente que a origem da vida no nosso planeta surgiu na Água. Ao longo de milhões de anos, os organismos vivos diversificaram-se e espalharam-se pela Terra, sendo que a sobrevivência de todas as espécies animais e vegetais continua ligada à Água. Mitos relacionados com ela, consideram-na um dos elementos essenciais da vida, a Matéria Prima que no projeto do homem está ligado à evolução do cosmos como um todo.

Tratar da Água nas religiões e na literatura clássica é conhecer uma multidão de divindades, ritos e mitologias aquáticas. Elas desenvolveram uma relação vital e simbólica com a Água. Isto vê-se na tradição oral, nos textos sagrados e nas práticas sociais.

Por isso, devemos ter presente o significado cultural e simbólico da Água quando a utilizamos. Um copo de Água contém mais de 10 milhões de moléculas que conviveram com os nossos antepassados e que conviverão com as gerações futuras, se soubermos defender este bem natural, património de toda a humanidade. Gotículas de Água guardam ″ingrediente secreto″ que pode estar na origem da vida.

Vamos trazer à colação a importância da Água em contextos míticos, bíblicos e religiosos, anteriores ao positivismo científico dos nossos tempos.

Os filósofos pré-Socráticos sustentam que o Universo é gerado de uma matéria única e original, “a Matéria Prima” que, para Tales de Mileto era a Água; para Xenófanes de Cólofon era o mar, fonte de Água e vento, e para Empédocles, um dos quatro elementos “. Água fogo, ar e terra.

No Egito, o Deus eterno era representado por uma serpente enroscada num vaso de Água. Para os polinésios, as águas primordiais eram mergulhadas nas trevas cósmicas,

Na mitologia babilónica,” nós criamos cada ser vivo a partir da Água”.

Cosmogonia bíblica: Segundo o Génesis, o espírito de Deus movia-se sobre a superfície das águas e decidiu que elas fossem povoadas de inúmeros seres vivos. O mar antes das terras. e as águas fonte de vida.

Cosmogonia muçulmana: Os céus e a terra formavam uma massa única que nós separámos. (…)Da Água tirámos todas as coisas viventes. (Alcorão, Capítulo 21.30). Tese idêntica à do Génesis.

Na cosmologia do Induísmo aparece em grande destaque o Ovo de Ouro depositado nas águas. que originou os seres que povoam a terra.

 Em muitas mitologias, a criação acontece na medida em que o caos é ordenado, pela separação dos elementos (Água-terra-fogo-ar). Assim o caos(desarmonia)transforma-se em cosmos (harmonia). Em muitas narrativas este processo de ordenamento cósmico parte da Água, ou supõe-na como invólucro do caos. A Água não seria apenas um dos elementos, mas o elemento primitivo em que os outros estavam imersos.

Estamos perante uma associação profunda, primordial entre a Água e a vida como a destruição e a ressurreição simbologia que se encontra no batismo dos cristãos, judeus, muçulmanos e outras religiões, como a religião cósmica, paradigma de todas as outras.

Enuncia-se deste modo uma cosmogonia aquática que implica três movimentos: entrada na Água (Imersão) que é a morte, diluição na mesma e emersão com o regresso à vida. Ou seja, nascimento, morte e renascimento. Em todo este ciclo está a Água.

A literatura clássica não omite o problema da Água como podemos ver, por exemplo, nas Metamorfoses de Ovídeo (I,I-3) “Ante mare et terras et quod  tetigit omnia caelum, unus erat toto naturae vultus in orbe quem dixere Chaos” (Antes do mar e das terras e de tudo o que banha todas as coisas só existia o chamado Caos) que era um amálgama onde se confundem terra, água e o ar que na água se juntaram para constituir o cosmos(caos<cosmos).

Ritos de aspersão, ablução e imersão

Nas Religiões, o uso ritual da Água segue um ritmo de envolvimento crescente que vai desde a simples aspersão, até à total imersão. Outro ritmo a considerar é o da interioridade, que vai da sensibilidade exterior à interior, com a ingestão de águas sagradas ou abençoadas. Gestos cultuais desse tipo registam-se amplamente. Para se livrarem do ciclo de reencarnações, os hindus mergulham no Ganges, considerado rio sagrado.

Os muçulmanos lavam os pés, os braços e o rosto antes da oração. Nos templos subterrâneos dedicados a Mitra (divindade indo-ariana da Pérsia) havia um ribeiro, para banhos de iniciação batismal. Na Gália pré-românica (atual França) centenas de lagoas e fontes eram consideradas miraculosas: beber sua água assegurava saúde, fertilidade e boa-sorte.

Quando João Batista voltou do deserto anunciando o tempo messiânico, usou o banho (baptismós) como sinal público de conversão (cf. Mc 1,4-5). Jesus de Nazaré ordenou este rito quando enviou seus apóstolos a pregarem a boa-notícia do Reino de Deus (cf. Mt 28,19).

O dilúvio e a renovação cósmica

Estamos perante uma associação profunda, primordial entre a água e a vida como a destruição e a ressurreição pela Água, simbologia que se encontra no batismo dos cristãos, judeus, muçulmanos e outras religiões. O simbolismo diluviano é uma constante em várias tradições religiosas. Estas tradições muito antigas encontram-se no mundo clássico, como em gentes orientais e primitivas, não, porém em todos os povos.

A narrativa do dilúvio que deu origem a várias imitações é semelhante à epopeia babilónica de Gilgamesh que encontramos .no relato bíblico sobre a arca de Noé, a arca e a preservação das espécies.

Podemos referir também a narrativa egípcia sobra a destruição dos homens, a lenda do dilúvio apresentada na mitologia indiana, as lendas do dilúvio americanas, europeias.

Morte diluição e renovação são o simbolismo do dilúvio e da vida.

Raul da Cunha e Silva
Presidente da Assembleia do Clube Unesco da Maia

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